Com evolução humana que data mais de quatro milhões de anos, onde o que garantiu a sobrevivência da espécie foi a vida em comunidade num plano organizado e sustentável, é uma pena que em pleno século XXI o Haiti seja uma realidade. A quem culpar? Quem são os pais da barbárie humana vivida nesse pedaço do mundo? Um sábio pensador cubano chamado José Marti dizia que a política é a arte de fazer homens e mulheres felizes. O mundo não tem entendido isso, tem predominado o egoísmo sobre a solidariedade, o ódio sobre o amor, a guerra sobre a paz, o interesse de alguns povos sobre o de varias nações. O Haiti é uma clara evidencia de que nosso planeta só pode ter dois caminhos: A continuação da ideologia e política capitalista, onde seres humanos são programados por esta sociedade para o principio da acumulação do capital fechando os olhos para quaisquer outras questões, inclusive de sua própria existência ou o do socialismo, onde o grande foco é a continuação do desenvolvimento da parte humana que reside em cada individuo, garantindo assim o prosseguimento da atividade produtiva com a perspectiva de inclusão social. Na época em que vivemos, alguns métodos de construção social precisam mais do que nunca ser reformulados. Só teremos futuro se o avanço do socialismo se der por mecanismo pacíficos, movidos pelo amor, considerando o igualitarismo como uma atrasada utopia, entendendo o Estado como a garantia do ponto de partida e não como ponto de descanso e tendo na natureza o exemplo que o equilíbrio surge da diversidade. O capitalismo já demonstrou toda sua fragilidade como forma de desenvolvimento e brutalidade como modelo social. O maior exemplo hoje é ver que o pior, o mais miserável e embrutecido lugar do mundo, o Haiti, esta a 934 km do país mais poderoso do planeta, os EUA, sendo que a relação nessa antítese continuava sendo a de exploração e expropriação até a catástrofe vivida em janeiro deste ano pelo povo haitiano.
Em fevereiro desse ano, um grupo de 10 médicos brasileiros formado na Escola Latino americana de Medicina, onde também me incluo, embarcou rumo ao Haiti, como parte da maior missão médica existente naquele país, que é a brigada Cubana. Acompanhe algumas partes dessa linda e humana experiência:
Dr. Tony Gleuber Pereira da Silva , graduado na ELAM em 2009, natural de Aracaju- SE, uma daquelas pessoas que ver a prática como único meio de demonstrar o compromisso que cada um tem com a causa social.
Dra: Sarah Zapico Breta, graduada na ELAM em 2009, natural de Sabará-MG, uma médica com elevado sentimento pelas causas humanas, hipercrítica e comprometida.
Dr. Adriano de Oliveira Carneiro, graduado na ELAM em 2006,natural de Cruzeiro do Oeste- PR, prático, formulador, com um elevado conhecimento de gestão em saúde.
Dra. Marina Abreu, corradi Cruz, graduada na ELAM em 2007, natural de Betim-MG, gestora em saúde, humanista, movida pelo principio do amor com os povos.
Dr. Pedro Melo, graduado na ELAM em 2006, natural de Aracajú-SE, um ser humano incrível, daquelas pessoas que transporta energia do bem e irradia ao meio. Conseguia manter meio ao caos haitiano o auto-estimar do grupo com seu bom humor.
Dra Ana Rosa Santana Tavares, graduada na ELAM em 2009, natural de São Paulo-SP, movida por princípios humanistas e internacionalistas.
Dr. Marcio Rogério Camargo, graduado na ELAM em 2009, natural de Novo Horizonte do Sul-MS, uma daquelas pessoa que segue a risca a teoria de que na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Conhecido como Jacaré, não tem vaidades, sua marca é a humildade.
Dr. Christian Anderson dos Santos Guzman, graduado na ELAM em 2007, natural de Urbano Santos – MA, um médico com visão de futuro avançada, ético e com objetivos claros.
Dr. Janilson Lopes Leite, graduado na ELAM em 2009, Natural de Tarauacá-Acre, Acredito que tudo na vida é possível, inclusive que um dia o Haiti será uma grande nação.
Dr. Alberto Campos, graduado na ELAM em 2006, natural do Rio Grande do Norte, vive uma vida internacionalista, casado em Cuba e tem Planos de morar definitivamente no Haiti.
A viagem:
Cada um dos médicos saiu de seu Estado, com passagem custeadas pelo governo Cubano. No trajeto, cruzamos todo o Brasil em vôos nacionais chegamos até São Paulo, daí a TAM e GOL nos conduziram pra Caracas- Venezuela ou Buenos Aires-Argentina. Nessas capitais embarcamos na Cubana de aviação com destino a Havana, onde passamos uma semana, recebemos varias vacinas, algumas instruções e partimos rumo ao Haiti.
No aeroporto de Caracas descansamos um pouco
Grana curta, arepa cara, a saída foi dividir duas delas em cinco pedaços. O milagre dos Paes...
Aeroporto de Havana, nós e outros médicos latinos americano sob uma mesma bandeira. A Cubana.
Dr. Guzman, carro lotado e muita expectativa rumo ao Haiti.
A chegada ao Haiti:
A ansiedade era enorme, saímos de havana na madrugada de 28 de fevereiro em um vôo da aerocaribenha, fizemos escala em Santiago de Cuba, e as 8:35 am sobrevoávamos o Haiti, era uma imagem sinistra, parecia uma mina de pedras, de concreto em contraste com as cores de azul e branco das cabanas que passou a ser a moradia oficial no país. Quando a avião pousou parecia que estávamos meio a uma grande guerra, muitos soldados, caminhões, tanques, destruição, um ambiente de elevada repercussão psicológica. Autoridades cubanas nos esperavam no aeroporto.
O contato com a destruição e o caos. Assim está Porto Príncipe.
Finalmente pisamos em solo Haitiano, o que parecia meio fantástico era realidade, estamos pela primeira vez demonstrando que a incorporação do humanismo durante nosso processo de formação era uma realidade. Haiti aqui estão os médicos brasileiros formados na ELAM. Acabamos sendo a maior brigada não organizada institucionalmente, perdendo apenas para Bolívia e Venezuela, onde Chaves e Evo deram incentivos e condições para a ida de seus médicos.
Com orgulho representando o Brasil
Uma nova etapa de nossas vidas estava começando naquele momento
As orientações
Muita atenção
Rumo ao ônibus que nos levaria pra o acampamento
A equipe com Dr Carrizo, reitor da Escola Latinoamericana de Medicina. Um profissional sem igual. Estava no Haiti dirigindo o processo de discussões sobre a implantação de um novo sistema de saúde no Haiti e os trabalhos de nossa brigada.
O contato com a destruição e o caos. Assim está Porto Príncipe.
No trajeto rumo a nosso acampamento, fomos presenciando cada cena, parecia filme ou a consolidação da teoria do caos, um ambiente que modificava a cada momento a expressão de cada um de nós, algo que com certeza nunca mais esqueceremos.
Um país vivendo em carpas, quer dizer os que conseguiram uma.
A destruição, algo inacreditável. Quilômetros de concreto. Em alguns lugares ainda cheirava a mortos.
Os meios de transporte
A busca por alimentos, um caos.
Os esgotos a céu aberto, fóco para as epidemias pós terremotos.
O Abandono
O acampamento:
Instalamos-nos na área de uma escola muito simples, a vida adquire um novo caráter, vivendo em casa de campanhas em grupos de seis, água e alimentos racionados, banheiro sem luxo, privadas tipo letrinas, cercado de muita miséria, crianças que visitavam nosso espaço em busca de salvação, um novo ambiente. Ali formamos uma grande família, onde a principal tarefa além de cuidar da saúde dos haitianos, era cuida um dos outros.
Levantando a tenda e limpando o espaço onde passaríamos a viver.
Nossa tenda.
A brigada brasileira
Limpando o terreno
Prontinho, aqui virou nossa casa
A proteção com mosquiteiros era indispensável num país endêmico em malaria e com uns pernilongos que pareciam uns morcegos.
O banheiro, de gotas em gotas nos banhavamos e tudo terminava bem
Um dos momentos mais desgradaveis era a visita a este lugar.
Sala de consultas
Hospital
Laboratório
Utrasonografia e eletrocardiograma
Urgências
Fisioterapia
Fé e esperança
O trabalho
Todos os dias, além do trabalho prestado dentro do acampamento nas mais diferentes áreas, ainda formávamos grupos de trabalhos que marchavam comunidades adentro com medicamentos para salvar vidas. Lideres comunitário reuniam a população em igrejas, escolas, creches, bairros, no meio de grande acampamentos, e ali fazíamos serviços de assistência. Cada viagem era uma historias diferentes, comunidades que nunca tiveram um médico, crianças órfãs de pai e mãe etc. Percebíamos na expressão de cada Haitiano a esperança projetada em nós, alguém com quem poderiam contar naquele memento difícil de suas vidas, de dor, enfermidades, fome, falta de perspectivas. Parecia ser uma responsabilidade muito grande pra quem naquele momento só poderia ajudá-los nos seus problemas de saúde. O trauma psicológico devido a perca de familiares é uma marca que nunca mais deixará pais e filhos serem os mesmo naquele país.
Consulta em terreno, filas longas,muitas patologias, sobretudo de pele e do aparelho respiratório. A proteção era indispensável. A anemia como conseqüência do paludismo era um evento comum.
Dra Sarah, muita dedicação e carinho com aquele povo sofrido.
Dra Marina, Chegou a comunidades onde jamais as pessoas haviam visto um médico na sua frente. Regiões das altas montanhas Haitianas
O Psiquiatra da equipe, haviam momentos que seus serviços serviam também pra membros da equipe médica, pois o trauma psicológico de esta no meio de tanta miséria, daquela barbárie humana, não era bem manejada por todos. Na comunidade ele trabalhava com as crianças em especial tentando diminuir a agressão que aquele terremoto imprimiu no “espírito” de cada individuo. Esquecer será impossível, pois jamais se esquecerão de seus familiares pedidos naquela catástrofe.
Dr. Pedro em consulta de pediatria, uma identificação profissional
Dr. Adriano, deixou a esposa e seu filho pequeno no Brasil, os quais sempre eram relembrados, aqui ele buscava distribuir um pouco de seu afeto paterno para as crianças haitianos
Eles adoram mexer nos cabelos da gente....fazendo festa.
Somente estas criaturas conseguiam dormir tão tranquilamente. Sua inocência não a permitia medir a dimensão da complexidade de seu mundo.
Dr. Marcio, o Jaca, aqui em consulta clinica, mas sua fascinação era pelas atividades cirúrgicas. Era preciso muita cautela e proteção para entrar nas atividades cirúrgicas. Muitas doenças fazem parte da epidemiologia haitiana, sobretudo a AIDS.
Grande Dr. Guzman em consulta. O que poderia ter essa paciente com esse biótipo tão longilíneo, emagrecido, rosto de sofrimento? Bom aqui ele está examinando o aparelho respiratório, só falta a febre e sudoreses noturna. Alguém arrisca dizer do que se trata? Possivelmente TB, algo muito freqüente. Cadê o nasobuco doutor?
Aqui o doutor Tony tentava melhorar a aparecia do doutor Jacaré. Depois disso começaram chamá-lo por outro nome. Doutor Crocodilo. Tire suas conclusões.
As Doenças
Chegamos ao Haiti num momento de transição epidemiológica. Diminuíam os traumas físicos (amputações, esmagamentos, queimaduras, traumas, fraturas) e se instalavam os traumas psicológicos deixados pelo terremoto. As doenças endêmicas como malaria, febre tifóide, leptospirose, TB, hepatites se alastravam. As doenças conseqüência da falta de higiene, das convivências em acampamentos, com pouca ou nenhuma água, tomavam conta das consultas, tais como: como escabioses (Pira) sobre infectada, outras dermatoses, doenças respiratórias, vaginosis, infecção urinaria e diarréias. Além das consultas também distribuíamos os medicamentos, pois sabíamos que se não fosse assim, eles nunca fariam o tratamento, pois se quer tinham dinheiro pra comida. Também vacinávamos e realizávamos atividades de promoção.
Der uma olhada nesse caso, talvez nunca mais deixará de diagnosticar essa doença. Lesões de pele em forma de queimadura de cigarro. Impetigo contagioso. Isso era extremadamente freqüente.
Hérnia umbilical... Critério cirúrgico.
Esta era uma lesão muito estranha, exofítica, branca, com base vascularizada, parecia as lesões por HPV. De livro.
Este rosto é expressão do sofrimento, da miséria, da falta de perspectiva. Na pele, escabiose(sarna) sobre infectada por estreptococos
Veja isso, um desastre e extremadamente frequente
Impetigo contagioso e muito sofrimento.
Outra lesão estranha, um grande nódulo que expulsava uma substancia leitosa. Alguém pode imaginar o que seja? Abscesso subcutâneo.
Paciente jovem, 22anos, que há 2 anos começou apresentar dor lombar, perca da força nas extremidades inferiores, além de grande deformidade da coluna lombar. No dia dessa consulta já não caminhava. Na radiografia se via L2 em forma de cunha. Em um país endêmico em TB, alguém tem idéia do que possa ser isso? Pois é, TB vertebral, Mal de Pott.
Lesão conseqüência do terremoto e infeccionada
Cirurgias todos os dias eram realizadas, muitas da área de ortopedia, ginecológicas e obstétricas. Cansei de ver os clássicos tumores de mama com todos seus elementos clássicos, mamilo retraído, pele em casca de laranja, aderido a plano profundo e com adenopatia axilar...pois é, entregues ao acaso
O que poderá ser isso? Uma hidrocele.....uma hérnia ingnoescrotal....? Sinistro né? Em terra de filarias elas não podiam serem esquecidas. Pois é, filariasis escrotal.
Aqui uma doença muito conhecida no Brasil, a FOME e o descaso, sobretudo com as populações negras e indígenas. Hoje é a cara mais vista no Haiti, a de milhões de famintos.
A vida depois do Haiti não poder ser a mesma, não deve ser igual, não tem a mesma cor. O mundo virou um lugar perverso, está no seu avesso, caminha muito mal. E ai, o que pode ser feito, isso ainda tem jeito, ou deixa a roda girar? Em vida, tudo é possível, devido o poder incrível do bem e o amor. Num jardim em que se cultiva rosas, espinhos ferem mas não gozam de nossa atenção, os olhares são para o botão e pétalas coloridas que perfumam a imensidão. O Haiti um dia se levantará.......
Doutor Janilson Lopes Leite
30 de março de 2010, depois de uma inesquecivel experiência no Haiti
Importante:
Todo nosso trabalho no Haiti como médicos foi de ordem voluntária, inclusive toda ação desenvolvida por Cuba naquele país trata-se de seu histórico papel solidário aos povos humildes desse planeta.
Ah por favor não deixe de ver este vídeo clip:Perfeição